Número de negros empreendedores aumentou nos últimos anos e já somam mais de 15 milhões de donos de negócios
“Por mais que a minha infância tenha sido difícil, na minha vida encontrei pessoas que me estenderam as mãos e por isso eu pude reconstruir a minha história também”, conta Lucelena Felipe, que hoje aos 49 anos, tem se destacado na confecção de roupas e acessórios afros no município de Itararé.
Negra, pobre e órfã de pais, Lucelena cresceu em instituições e lares adotivos, até se tornar adulta. Trabalhou na colheita de algodão, como empregada doméstica, babá e balconista, até que resolveu, após uma longa depressão, ressignificar a sua vida. Depois de atuar por sete anos como conselheira tutelar e ajudar a crianças como ela a garantir os seus direitos, Lucelena decidiu empreender.
“Eu não me sentia inserida, não fazia parte daquela família ou núcleo. Eu era alguém à parte, não tinha uma história e eu precisava construir uma. Decidi ser conselheira tutelar, porque me identifiquei com a missão, que era garantir os direitos de crianças e adolescentes, eu que tinha tido uma vida toda cheia de violações de direitos. Fiz esse trabalho por sete anos, mas adoeci emocionalmente e acabei ficando com depressão. Precisei me afastar do trabalho, mesmo sem querer”, conta.
“Já em tratamento eu precisava fazer algo que tirasse o meu foco das coisas ruins, quando decidi empreender. Pesquisei na internet e encontrei umas peças de colares e brincos feitos com tecidos africanos. Desmanchei um colar e um brinco e os refiz. A partir daí não parei mais. Exatamente no dia 20 de novembro irá fazer dois anos que eu iniciei essa atividade de empreendedorismo”, relembra.
Proprietária de uma loja localizada no Centro de Itararé, hoje Lucelena além dos acessórios também fabrica sacolas, roupas e lenços, que são feitos com tecidos importados da África. Depois de participar de um evento da Associação Comercial expondo os seus trabalhos, a empresária tornou-se mais conhecida na cidade e além do ofício é também vice-presidente da Associação dos Artesãos de Itararé.
Como boa empreendedora, Lucelena sentiu a necessidade de se profissionalizar para melhorar o seu negócio. Neste momento ela foi apresentada ao Sebrae-SP, por meio da Associação Comercial, onde participou de alguns cursos, palestras e treinamentos.
“Eu participei de alguns cursos na Associação Comercial com o Sebrae-SP. Também fiz uma viagem com o Sebrae-SP, que nos levou para a Mega Artesanal em São Paulo. Tive muita troca de experiência com pessoas e encontrei produtos para as peças que eu fabrico. Durante a inauguração da Casa do Artesão em Itararé, o Sebrae-SP esteve presente também e na ocasião solicitei ajuda, pois sou muito nova no ramo e não tenho tanto entendimento de empreendedorismo. Eu estou aprendendo, buscando conhecimento e o Sebrae-SP tem sido fundamental neste processo”, explica Lucelena.
Apesar das dificuldades enfrentadas no início, a empreendedora tem se estabilizado no setor e buscado crescer cada vez mais. Ela conta que sonha em ampliar sua loja e aumentar a sua produção. “Gostaria muito de ver meu trabalho reconhecido e sendo entregue em todo o país”.
Segundo estudo realizado pelo Sebrae, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), em 2013 existiam 12,8 milhões de pessoas negras donas de negócios, saltando, em 2023, para 15,6 milhões, num universo de 98,4 milhões de pessoas negras no país com mais de 14 anos.
Lucelena faz parte desta estimativa e além de empreender também ensina outras mulheres negras a sua arte. Ela tem um trabalho social com quilombolas em Itararé e na última semana esteve no Quilombo Fazenda Silvério para confeccionar brincos e colares com futuras empreendedoras. Este movimento tem se desenvolvido por meio da Lei Paulo Gustavo, na qual conseguiu recursos para ensinar artesanato às mulheres quilombolas.
“Elas têm uma luta lá muito interessante. O trabalho das meninas é mais voltado para a agricultura. O Sebrae-SP e o Sindicato Rural têm dado bastante respaldo, apoio e incentivo para elas, com o objetivo de capacitá-las na agricultura familiar. Agora eu também estou trabalhando com elas, as ensinando a fazer brincos e colares afros para que possam aumentar ainda mais a sua renda”, conta Lucelena.
Empreendedora, mãe, esposa, artesã, professora e vice-presidente da Associação dos Artesãos de Itararé, Lucelena ainda encontra tempo para ministrar rodas de conversa. Tanto que no próximo dia 20, Dia da Consciência Negra, ela fará um bate-papo sobre racismo estrutural no espaço de eventos na Estação Ferroviária. Durante todo o dia haverá música, recital de poesias, desfile e palestras.
“O Dia da Consciência Negra, na verdade, não é para o povo negro, mas sobretudo para a população branca, para que se conscientize e olhe para uma história que foi por muito tempo apagada, escondida e negligenciada. Eu vejo que muita coisa avançou, mas nós precisamos avançar muito ainda e falar sobre racismo é muito importante. O futuro, o mundo que eu quero para os meus filhos, netos e para toda a criança, que já exista ou que venha a nascer é um mundo de respeito, em que as pessoas se sintam inseridas no seu espaço, respeitadas pela condição que têm, que sejam vistas como capazes de realizar algo”, diz.
“Eu quero um mundo onde as pessoas acreditem, tenham fé, pois existe algo muito maior que nós e não estamos sozinhas. Por mais que a vida seja difícil, se olharmos para o lado terá alguém que nos estenderá as mãos. Eu fiz disso também uma motivação para a minha vida, porque sozinha não conseguimos nada, mas com Deus na frente, com muita fé e buscando sabedoria e ajuda, chegamos lá”, finaliza.
Neste link da página do Sebrae, você pode ficar por dentro do afroempreendedorismo Afroempreendedorismo feminino – Sebrae.